Capítulo I: Pomar Dourado



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Capítulo I: Pomar Dourado

Era quase meio dia, o céu estava claro e o vento chacoalhava as folhas amareladas das árvores de Pomar Dourado, uma pequena vila situada em uma área marcada por sua vegetação exuberante e de coloração dourada que dava um ar místico e único ao local. Porém, apesar da localização deslumbrante, o vilarejo sofria de extrema pobreza em decorrência do esgotamento das minas de ouro, que em tempos passados eram abundantes e contribuíram para a expansão e o crescimento do povoado. Os tempos de ouro de Pomar Dourado há muito já se foram, e o que resta da pequena vila são pequenos palacetes abandonados, casas de madeira de aspecto triste e deprimente e uma população de camponeses que possuíam uma vida simples e cheia de dificuldades

Em uma clareira em meio à floresta amarelada, uma pequena criatura de pelagem alaranjada e patas pequenas golpeava incansavelmente um boneco de pano com uma espada de madeira. A cada segundo que se passava os golpes se tornavam cada vez mais fortes, até que num golpe final o boneco foi cortado ao meio. Esse é o hamster Crito, de pequena estatura, mas grande coragem e determinação. Seu principal objetivo era treinar até fortalecer o seu corpo e mente até se tornar um guerreiro perfeito para viajar até a capital e ingressar no exército imperial, onde almejava conseguir fama e prestígio para ajudar os moradores de Pomar Dourado. Para alcançar suas metas, Crito seguia uma dura rotina de treinos desde a infância, experiencia que o transformou em um exímio espadachim, de grande agilidade e inteligência em batalha.

Após o último golpe no boneco de pano, Crito se deita no chão ofegante, quando de repente aplausos podiam ser ouvidos ao longe e uma figura de penas negras, bico fino e olhos vazios se aproximava do pequeno hamster com um sorriso no rosto. Surge Ázaro, o velho corvo responsável pelo treinamento de Crito.

O corvo Ázaro é uma das pessoas mais misteriosas de Pomar Dourado, sendo um de seus habitantes mais antigos. Ninguém sabe ao certo o motivo da vinda de Ázaro ao vilarejo ou de onde ele veio, por ser extremamente reservado e nunca ter comentado nada sobre o seu passado, mantendo segredo até mesmo de Crito, seu próprio aprendiz. Despertando a curiosidade dos demais habitantes, diversos boatos foram criados sobre ele, dentre estes, que o corvo teria sido um soldado de elite do exército imperial de Gran Naville que foi invalidado em batalha. Esse boato era bastante espalhado e explicaria as diversas cicatrizes espalhadas pelo corpo da ave, a falta de uma de suas patas e o uso de uma perna de pau, que provavelmente foi resultado de uma de suas batalhas e sua extrema proficiência com espadas e inteligência estratégica.

Ázaro começou a treinar o jovem Crito logo após a morte dos pais do hamster em decorrência da Guerra das Calêndulas. O pequeno Crito resolveu seguir Ázaro escondido enquanto o corvo caçava formigas e percebeu o quão forte e habilidoso o corvo era. Com o sonho de se tornar um bravo soldado e auxiliar a todos os necessitados de Pomar Dourado, Crito resolveu implorar para que Ázaro o ensinasse a lutar. No começo o corvo sempre negava as tentativas do hamster, mas a insistência e a dedicação da pequena criatura o fizeram perceber o potencial adormecido que havia no garoto, e que talvez ele fosse o escolhido para resolver um problema extremamente complicado. Desde então, eles se tornaram o velho mestre e o pequeno aprendiz.

Ázaro chega perto do hamster caído ao lado do que restou do boneco de pano.

Cuá! Sua técnica está quase perfeita pequeno, finalização precisa! — Disse o corvo empolgado, que sempre começava suas falas com um alto corvejo.

— O... obrigado velho — Respondeu o hamster ainda ofegante.

Cuá! Acredito que você já esteja pronto para a última etapa do seu treinamento. Você se saiu bem contra um alvo imóvel, mas veremos como lidará com algo que possa revidar.

— Tu... Tudo o que for necessário pra... sair logo daqui.

Cuá! Muito bem, mas antes de prosseguirmos com o treinamento é melhor finalizarmos por hoje — Falou o corvo, enquanto ajudava Crito a se levantar. — Direi os detalhes no caminho.

Crito pega sua mochila e sua espada e os dois seguem caminho de volta para o vilarejo.

— Então, qual o último passo? — Indagou o hamster.

Cuá! Como você sabe estamos no verão, época de migração dos grandes besouros azuis.

— E... onde você quer chegar com isso?

— Os besouros azuis são uma das espécies mais perigosas de insetos quando provocados. São ágeis e espertos, o treinamento perfeito pra você!

— Então eu só preciso abater um desses e estarei pronto pra sair daqui?

— Não será necessário, além de que abater um desses é um desafio até para os guerreiros mais habilidosos. O seu desafio vai ser me trazer o chifre.

Os insetos eram em sua maioria seres irracionais com comportamentos selvagens. Muitos deles como as formigas e algumas espécies de besouros eram criados em fazendas para o consumo, com a carne desses insetos sendo muito apreciada por todos os reinos.

— Só o chifre? Não parece ser muito complicado.

Cuá! Não subestime esses besouros, eles são muito mais perigosos do que parecem. Agora vamos nos apressar que está quase anoitecendo. — Disse o corvo enquanto se aproximavam de Pomar Dourado.

Após os dois chegarem no vilarejo, eles se separaram e Crito entrou em sua cabana. Crito morava numa velha cabana de madeira que foi deixada por seus pais. A cabana era simples, contendo apenas um cômodo composto por uma mesa, cadeira, cama e uma fornalha, além dos equipamentos necessários para seu treinamento. O hamster cozinhou cenouras e assou maçãs para o jantar, enquanto se preparava para o desafio que enfrentaria no dia seguinte. Consertou sua espada de madeira que havia sido danificada no último treinamento e guardou em sua mochila seu estilingue com as munições e bandagens para serem utilizadas em caso de emergência. Depois de deixar tudo pronto para o dia de amanhã, ele deitou em sua e adormeceu.

Crito abre os olhos e se vê em no topo da torre de um enorme castelo. Uma enorme camada de nuvens negras cobre o céu e uma fumaça espessa surge em seus pés, até que a fumaça começa a subir, formando uma enorme e assustadora figura de um corvo. O hamster, assustado com toda a situação permanece imóvel e trêmulo. A figura do corvo se aproxima de Crito e com uma voz sinistra profere:

VOCÊ FALHOU

Em seguida o corvo dá um grito ensurdecedor e vai para cima de Crito, engolindo-o com seu enorme bico e envolvendo-o em trevas, escurecendo completamente a visão do hamster. Ele abre os olhos, está ofegante e seu coração bate depressa. Tudo não passou de um pesadelo.

Capítulo II: O chifre

Ainda sem conseguir processar o que aconteceu, Crito se levanta da cama, e por mais que tentasse tirar o pesadelo de sua cabeça, não conseguia parar de pensar na figura do corvo e nas palavras ditas por ele. Criou coragem para se levantar de sua cama, comeu uma maçã e pegou suas coisas para se encontrar com seu mestre no portão do vilarejo. Vestiu sua armadura com proteções de couro e colocou luvas em suas pequenas patas. Depois de permanecer um tempo em silêncio para meditar, Crito sentiu que estava pronto para encarar a última parte do seu treinamento.

Ao sair de sua cabana, Crito trilhava seu caminho nas estradas tristes do vilarejo. Cumprimentou o ferreiro e alguns outros moradores enquanto andava em direção ao seu objetivo. Chegando lá, Ázaro o esperava com um sorriso no rosto.

Cuá! Então, preparado para a última prova do seu treinamento?

— Desde o dia em que eu comecei.

— Ótimo, viajaremos até a fronteira da região áurea, onde os besouros azuis estão localizados. E lembre-se, aconteça o que acontecer, não vou interferir.

— Certo, acho que não vai necessário. Agora é melhor nós irmos andando.

Cuá! Não sei o que faço com essa sua pressa.

Com tudo pronto, os dois saíram do vilarejo em direção a fronteira, passando pela grande floresta de Pomar Dourado e passando pelo Rio Sior, uma caminhada que duraria pouco mais de uma hora. Eles estavam quase chegando na fronteira, onde o amarelo das árvores e da grama começava a se desbotar até se transformar em um verde brilhante, quando de repente um rugido monstruoso pôde ser ouvido. Ázaro pediu para que Crito se abaixasse e os dois foram se rastejando pela vegetação para não serem percebidos pela criatura, e foram se aproximando lentamente até conseguirem enxergar o besouro entre as folhas.

Ao bater os olhos na criatura, Crito fez uma expressão de surpresa, era a maior e mais ameaçadora criatura que ele havia visto em toda a sua curta vida. Essa espécie de besouro é conhecida pela sua agressividade quando ameaçados, sendo considerada a espécie mais perigosa de inseto de toda a região, com carapaça dura que lhes proporciona resistência e um chifre tão afiado que alguns dizem que poderia furar uma pedra com um único golpe.

Apesar da imponência da criatura, Crito reúne toda a sua coragem, segura firme a sua espada e caminha sorrateiramente em direção ao bicho, olhando por um segundo para seu mestre, que também o olhava, com um olhar de confiança. Ao chegar perto do besouro, ainda sem ser notado, Crito se prepara para dar um golpe certeiro no inseto, mas ao preparar a pose dará desferir o golpe, o hamster pisa num galho, o que acaba assustando o animal. O besouro começa a se sacudir e pular, o que acaba jogando Crito pra longe e fazendo com que ele bata em uma árvore. O hamster fica desorientado por alguns segundos graças ao impacto com a árvore, e ao perceber toda a situação, o besouro se prepara para dar uma investida certeira, ciscando o chão e correndo na direção de Crito.

O chifre afiado se aproximava cada vez mais rápido até que... PÁ! Crito consegue rolar a tempo e o afiado chifre fica atravessado na árvore e deixa o besouro preso por algum tempo, dá a Crito tempo suficiente para se afastar e pensar em uma nova estratégia para arrancar o chifre do feroz inseto. Ele observou seus arredores até perceber uma caverna com paredes que pareciam estar instáveis, uma oportunidade perfeita para imobilizar o besouro.

O único problema é que essa caverna estava atrás da criatura, e Crito precisava passar por ela para colocar seu plano em prática. Com certa dificuldade, o besouro consegue se desprender da árvore, e se prepara para dar outra poderosa investida no hamster, que estava determinado a passar pelo besouro. Crito colocou sua espada na boca, e em uma demonstração de coragem e velocidade correu o mais rápido que podia sobre as quatro patas em direção a fera, e quando o chifre da criatura estava quase perfurando o hamster, Crito deu um pulo com toda a sua força, aterrissando atrás da criatura, que não conseguiu frear a tempo e caiu rolando no chão. Enquanto a criatura lutava para se levantar, Crito correu o mais rápido que podia para a formação rochosa e parou ao lado de uma parede de aparência frágil enquanto esperava a criatura. O besouro se levanta, aponta o chifre para o hamster que está dentro da caverna e acelera com uma fúria nunca antes vista.

— Pode vir!!! Tô bem aqui chifrudo!!! — Disse Crito provocando o besouro.

O inseto arrancava e ia chegando cada vez mais perto, e quando estava quase se chocando contra o hamster, ele deu um rolamento para o lado e fez com que o besouro batesse a cabeça na parede. Com o impacto, a caverna começou a desmoronar e uma grande rocha caiu contra o besouro imobilizando-o, oportunidade perfeita para que o hamster sacasse a sua fiel espada de treinamento e cortasse o chifre em um único corte preciso. Com o chifre em mãos, Crito começou a correr enquanto os destroços caíam atrás dele, correndo sobre as quatro patas até conseguir sair da caverna, que ficou completamente bloqueada pelos pedregulhos.

Depois de toda essa confusão, o hamster, exausto, se deitou no chão para descansar de toda essa correria. Ázaro chegou aplaudindo e com um grande sorriso no rosto.

Cuá! Parabéns, você concluiu o último passo do seu treinamento! Mas que você saia desta vila, tenho um último desafio para você. — Disse o corvo enquanto pegava o chifre no chão.

— Mais um... desafio? Eu pensei que ... aquele era a ... última prova. — Respondeu o hamster ofegante.

— Ainda preciso de um teste final para garantir que você está pronto.

— O que... é.

Ázaro levantou o chifre cortado e o olhou fixamente.

Cuá! O desafio é simples! A única coisa que você precisa fazer é pegar o chifre da minha asa. Se você conseguir, estará pronto para iniciar sua jornada.

Crito se levanta, e estende a pata numa tentativa de pegar o chifre, mas Ázaro retira o chifre da direção de Crito, que inicia uma série de investidas para roubar o chifre, que são frustradas pela agilidade do corvo, que parecia prever os movimentos do hamster. O corvo esconde os chifres com as costas, e Crito se utiliza de sua velocidade para correr o mais rápido possível e deslizar por baixo de Ázaro, mas o corvo é mais ágil do que Crito poderia imaginar, e dá um enorme salto para cima enquanto ri das tentativas do hamster.

— Cuaaaaá! Esse é o máximo que pode fazer! Eu pensei que tinha treinado um guerreiro ágil, não uma lesma!

Ázaro pousou lentamente no chão e olhou para Crito, que estava cansado de toda aquela situação. O hamster ficou parado pensando em um plano para arrancar aquele chifre da mão de seu mestre, e percebeu que ir para cima dele não adiantaria nada. Para conseguir esse chifre Crito precisaria jogar sujo.

O hamster começou a correr em círculos em volta de Ázaro, que apenas permaneceu parado no centro. A velocidade de Crito era tanta que um pequeno furacão de poeira se formou ao redor do corvo, até que o hamster juntou um monte de poeira em suas patas e começou a jogar essa poeira em Ázaro diversas vezes enquanto corria em círculos, cegando e desorientando o corvo. Ao perceber uma brecha, Crito deslizou o investiu o mais rápido que conseguia contra o corvo, jogando um último monte de poeira em seus olhos enquanto colocava suas pequenas patas no chifre.

Quando a poeira baixou, surgia Crito vitorioso com o chifre na mão, e Ázaro logo atrás se sacudia para tirar toda a poeira e aplaudia o desempenho do hamster.

Cuá! Você conseguiu! Você agora está preparado para enfrentar qualquer dificuldade em sua jornada para Gran Naville.

— Obrigado velho.

— Vai partir amanhã? Ainda preciso te entregar algo Crito.

— Me entregar? O que seria?

Cuá! Essa é uma surpresa para amanhã, já é tarde, é melhor que você vá para casa e descanse bastante para a sua jornada.

Estava quase anoitecendo, o céu estava estrelado e o vento chacoalhava as folhas amareladas das árvores de Pomar Dourado, onde o brilho da lua era refletido pela exuberante vegetação de coloração dourada, dando um ar místico e único ao local. Depois de todo o treinamento, Crito retornou ao vilarejo e vencido pelo cansaço caiu direto na sua cama. Crito precisaria recuperar suas energias, já que o dia de amanhã era o dia pelo qual o hamster sempre esperou, o dia em que ele iria atrás de seu sonho, se tornar conhecido na capital e ajudar os moradores do vilarejo.

Enquanto isso, o corvo vasculhava seu baú de equipamentos antigos, até encontrar no meio de suas tralhas a sua velha companheira de batalha, que ainda estava preservada como nos seus dias de glória.




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